09 janeiro 2008

O Império do Medo...


O Governo português decidiu não referendar o novo Tratado da União Europeia.
Com o acordo do principal partido da oposição «PSD» e do Presidente da República, o Primeiro-ministro, depois de tão ilustre cerimónia e defesa de tão importante tratado, achou por bem decidir sozinho, com os seus pares na Assembleia da República, pela ratificação em sede de parlamento.
Não valerá a pena seguramente recordar a promessa eleitoral do Partido Socialista sobre a matéria. É apenas mais uma que não sai do papel. O assunto contudo é um pouco mais grave, visto ter o apoio de 80% da classe política e dos partidos que a representam.
Épocas houve em que o poder político fazia-se temer. Vivia-se então na sombra do espectro de Maquiavel. «Mais vale ser temido do que amado» era o príncipio que, durante três centenas de anos fez viver no silêncio e na submissão os povos do mundo Ocidental. Um dia porém, os povos cansaram-se e decidiram que não mais seria assim. Fizeram-se revoluções, travaram-se guerras, gastaram-se litros de tinta na elaboração de tratados e de convenções; tudo, para que o Homem conquistasse o seu direito à livre expressão e à livre participação política enquadrada numa formúla de direitos e deveres.
O exercício do poder político serviria então, finalmente, para servir os outros Homens num espírito de serviço público que conduzisse as Nações ao Progresso e à Felicidade; conceitos caros aos homens das Luzes.
No séc. XXI as coisas adulteram-se pouco a pouco. Não só os sonhos dos Iluminados ficaram em parte pelo caminho, apesar das enormes conquistas verificadas, como se obtém um resultado assaz estranho.
Hoje é a classe política que teme os povos. Foge deles como que temendo uma qualquer ilegitimação. O poder político democrático receia a própria força que lhe dá corpo, ou por má consciência ou por verdadeira ilegitimidade de decisão, cegando o mundo que a rodeia com incontáveis imagens de números, estatísticas e conferências de imprensa.
Dir-se-ia então que os povos nunca tiveram tanta força de decisão, mas tal não é inteiramente verdade. Os povos abdicam mais das vezes da sua decisão na mão daqueles que receiam devolver-lhes o poder de decisão, mesmo quando a isso a ética política os obrigaria.
Chegamos então a um momento histórico, em que, por debilidade do próprio sistema democrático, os «gerontes» apropriam-se conforme as circunstâncias e conveniências do poder de decisão que não é inteiramente seu, e os povos, amolecidos pelas imagens do mundo contemporâneo da facilidade e da irresponsabilidade, se deixam conduzir como cegos numa estrada ignorada.
Prova-se assim, não só a profunda enfermidade de que gozam as democracias europeias, nomedamente a portuguesa, como também a separação cada vez mais nítida, e pelas piores razões, entre a classe de governantes e governados, que, pelo andar da história, devia ser por esta altura uma só.
Um político que não serve um povo, então não serve para coisa nenhuma. Um Tratado que não serve os povos é inútil. Uma política que receia a sua aprovação levanta dúvidas.
Para acabar com as dúvidas, para aprovar um Tratado verdadeiramente útil e legitimado pelo conhecimento e pela decisão, e para a utilidade da classe política, seria bom que o governo português tivesse optado pela convocação de um Referendo.
O Governo Português, com o apoio da oposição e do Chefe de Estado fez o contrário.

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