Outro dia passei no recém reinaugurado (reabriu em finais de Fevereiro deste ano) jardim do miradouro de S. Pedro de Alcântara. Esteve mais de dois anos - sim dois anos! - encerrado para obras de requalificação, apanhado na teia das atribulações que a autarquia lisboeta viveu e sofreu nos últimos tempos.
Este espaço é, na minha opinião, das mais interessantes, belas e completas panorâmicas das cidade de Lisboa. Fruto do século XIX (das minhas épocas preferidas), concretamente do período romântico, ao qual a cidade tanto deve a vários níveis, entre eles o histórico, urbanístico, arquitectónico, artístico, etc.
Foi requalificado (ainda subsistem, contudo, alguns pormenores a acertar, como por exemplo alguma informação histórica que não detectei, porventura existe algum daqueles marcos metálicos com dados dessa natureza mas que não vislumbrei por lá) o que implicou a remoção do degradado e desenquadrado campo de futebol do patamar superior e de uma construção abarracada no patamar inferior utilizada para actividades menos próprias e nada saudáveis. A estatuária foi restaurada (embora existam algumas colunas no patamar inferior onde faltam os bustos), desde os bustos de heróis e deuses da mitologia clássica e de heróis portuguesa da época das Descobertas (patamar inferior) até à estátua de Eduardo Coelho (fundador do Diário de Notícias) que domina o centro do patamar superior. O lago (que terá vindo dos jardins ou do paço da Bemposta) neste mesmo patamar foi também recuperado assim como a cascata existente no outro patamar. As espécies botânicas replantadas e os espaços verdes tratados.
Todo este conjunto, particularmente agradável e apetecível em dias luminosos e mornos (nos quais Lisboa se revela mais meditarrânica do que atlântica), é e deve continuar a ser parte integrante e vivida da urbe (e vivida com toda a urbanidade...). Vir do Chiado, do Bairro Alto ou ainda da Calçada da Glória (o elevador esteve encerrado um ano e cinco meses devido às obras do túnel do Rossio; reabriu a 18 de Setembro do ano passado) e entrar naquele miradouro ajardinado, distribuido por dois níveis o que lhe confere uma atmosfera própria, suscita-nos sensações particulares, um misto entre viagem no tempo, exaltação dos sentimentos, da criação, da imaginação, da reflexão e de uma fruição ímpar do esplendor da cidade. Olhar a cidade e o seu inseparável Tejo brilhando ao Sol mais ao fundo do lado direito. Contemplar os vales da Baixa Pombalina e o da Avenida da Liberdade (antigo Valverde e Passeio Público). Na colina fronteira o Jardim do Tourel (miradouro um tanto ou quanto esquecido ou ignorado... tenho de lá ir para apurar o estado da arte...), a cúpula do Coliseu dos Recreios mais abaixo. Faz-me pensar que me situo num local que é o centro de um conjunto significativo de teatros: S. Carlos, S. Luiz, Mário Viegas, Trindade, Cornucópia, o referido Coliseu, Politeama, D. Maria II, Tivoli e claro o ainda esquecido Parque Mayer com os seus Maria Vitória (único em actividade), Variedades, Capitólio e ABC, bem perto da mancha verde que é o Jardim Botânico.
É bom ser lisboeta. Mas nem sempre. Nem sempre é bom e nem sempre é fácil quando somos confrontados com a degradação urbana, arquitectónica e humana que ainda persiste. Por desinteresse, por irresponsabilidade, por distracção, por vandalismo, por falta de cultura de cidadania, civismo e urbanidade. No actual S. Pedro de Alcântara recupera-se forças e energias quando estas teimam em faltar para alimentar este amor (que nunca se extingue) por Lisboa.
Voltou a ser vivido pelos lisboetas, por quem trabalha na cidade e por quem a visita. Finalmente!
2 comentários:
Caro ASD
Concordo em absoluto com as suas palavras.
Devo dizer-lhe contudo que os bustos do patamar inferior não estão lá porque foram roubados. E há muito pouco tempo, pouco antes da requlificação do jardim.
É pena mas é a realidade, resultado da incúria a que aquele espaço foi votado durante anos.
Seja como fôr, Lisboa voltou a recuperar uma das suas mais bonitas e importantes salas de visita.
Lá está irresponsabilidade, vandalismo e falta de urbanidade. É extraordinário! E infelizmente não é caso único. Agradeço esse acrescento PBH.
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