19 abril 2008

Não há partidos eternos

A não ser Roma e os diamantes nada mais é eterno. E mesmo estes já estiverem mais próximos do enquadramento perfeito no conceito de eternidade. Num mundo onde a globalização (nas suas várias vertentes e variantes) está em curso e em velocidade cruzeiro os acontecimentos sucedem-se muito rapidamente, sabemos de forma igualmente instantânea que as coisas aconteceram ou que vão acontecer e em muito mais sítos em simultâneo, assim como sabemos que outras deixaram de acontecer, outras de existir. Pode ser que seja nesta última moldura que têm lugar as forças políticas. Pelo menos nos modelos actuais. Todas, pelo menos em teoria. Os partidos políticos não são eternos, nem se devem tentar eternizar artificialmente através de plásticas de qualidade, no mínimo, duvidosa. Sabemos que neste mesmo mundo globalizado a imagem, o marketing e a comunicação assumem um papel cada vez mais activo (o que não tem de ser necessariamente mau se nas devidas proporções e no seu devido lugar na lista de prioridades). Para haver algo que deva e mereça ser mostrado, divulgado, comunicado é necessário que haja substância, conteúdo, não apenas uma bonita e moderna fachada com um interior a cair de podre, carcomido pela idade e não só...

Julgo que é neste contexto que se desenrola a recente (ou não tanto assim) crise do PPD/PSD. Mas não é o único que se tenta movimentar (mais do que crescer saudável e evoluir) no actual cenário, que não é exclusivamente nacional , sem um sucesso duradouro. O próprio PS irá, mais tarde ou mais cedo, perceber que está no mesmo barco e que enfrenta as mesmas tormentas, independentemente de maiorias, sejam absolutas ou não.

Social-democracia, democracia cristã, socialismo e comunismo marcam a história política internacional do pós II Grande Guerra. Será possível evoluirem sem se descaracterizarem e serem uma outra coisa? Julgo que, à partida, não. O que não deve ser necessariamente encarado como negativo ou catastrófico. Pode até gerar boas e perenes oportunidades e soluções. Reparem, poderemos considerar a chamada 3ª via de socialismo? Mesmo que seja um socialismo maquilhado com os epítetos de moderno, contemporâneo, democrático, etc, deixou de ser socialismo. E não é só uma questão semântica (o acordo ortográfico é uma outra história ou novela, como queiram). Aliás a semântica aqui só tem relevância no sentido em que é conveniente, a bem do desenvolvimento e do aperfeiçoamento da democracia, comunicar eficazmente estas modificações/alterações/evoluções/retrocessos.

O comunismo, por seu turno, sofreu poucas alterações doutrinárias, dito mais coerente. Acontece que a sua prática política há muito que já se afastou largamente daquilo que é em teoria. Logo, até amanhã coerência! O que é então o comunismo? A sua teoria? A sua prática? A contradição entre ambas? Ou ainda tudo isto em simultâneo? A meu ver a resposta parece-me bastante óbvia.


Se continuarmos este tipo de análise por outras ideologias políticas verificamos que, umas mais outras menos, mas na sua globalidade há alterações significativas que apontam no sentido da descaracterização das ideologias tradicionais. A vida política continua marcada por dois grandes espaços políticos : um à direita e outro à esquerda. Aqui, as mudanças (pois de facto nada será eterno) serão mais lentas. Mas nas ideologias que mencionei a situação está já a colocar-se. São já peças do museu político, ou seja, continuam a ser muito úteis à sociedade e ao seu desenvolvimento e a fornecer referências precisosas, mas já não estão a cumprir com agilidade o essencial da missão para a qual foram concebidas. Já têm outra função. Tal como acontece nos objectos museológicos propriamente ditos, antes de possuirem essa carga detinham outras funções, utilitárias, decorativas, etc.
No meio deste panorâma, e voltando a pegar no PPD/PSD (é assim que este partido político se chama, não utilizo esta designação por uma qualquer proximidade ou afinidade política particular com o Dr. Santana Lopes), a direita da democracia portuguesa (desde o centro político até à direita defensora da democracia e da liberdade, isto é, extremismos à parte) devia repensar-se, devia refundar-se. Urgem reflexão, debate, projectos políticos que promovam a iniciativa privada, a sociedade civil e a cidadania, o mérito, um Estado mais pequeno, mais eficiente e eficaz, uma reorganização das prioridades políticas, que traduzam sínteses entre conservadorismo e liberalismo assentes nos pilares da Liberdade, do Humanismo, do Personalismo. Mal estaremos se PPD/PSD, CDS/PP entre outras forças políticas que se encontram na área política que mencionei não tiverem esse capital, ou não o tendo na integra não sejam suficientemente visionários para o procurarem com energia, determinação, bom-senso e espírito crítico. É não cruzar os braços e pensar que há maiorias que são sempre relativas, como tudo é relativo neste mundo e na humanidade; até os partidos políticos, até mesmo a própria política.

Deixo-vos para a dita reflexão este interessante conceito de eternidade:

"Muito longe nas plagas boreais, numa terra denominada Svithjod, eleva-se um penhasco inponente de cem milhas de altura e cem milhas de circunferência. De dez em dez séculos, um passarinho pousa nesse rochedo, para aguçar o bico.

Quando dêste modo a avezinha houver consumido a rocha, ter-se-á escoado um único dia da eternidade."


in VAN LOON, H., História da Humanidade, 1935

7 comentários:

Pedro BH disse...

Caro André

Concordo consigo e penso muitas vezes com alguma preocupação que o nosso parlamento vive desde há muitos anos, praticamente desde 76 com as mesmas formações politicas. Nunca em Portugal um partido novo se conseguiu afirmar.
As ideologias politicas nas quais se fundam os maiores partidos portugueses são todas elas do séc XIX e principios do Séc XX.
Estão naturalemnte desactualizadas e daí sofrerem profundas crises de identidade.

Mas a verdade, é que os novos projectos políticos que se vão apresentando ou não têm força ou deixa-me morrer à nascença.

Claro está que a culpa reside necessáriamente na fraca participação politica dos portugueses que votam de forma cega, maioria das vezes na sua familia politica, sem se darem ao trabalho de escutar, defender ou militar propostas alternativas.

Ou será que a sua proposta vai no sentido de se refundarem partidos com os mesmos protagonistas?

Nuno Castelo-Branco disse...

Bem, na Inglaterra existem os mesmos partidos há mais de cem anos e o regime não parece periclitante por causa disso. Em Portugal, existem dois partidos iguais e hegemónicos. O PSD simplesmente devia desaparecer de vez. Perdendo a categoria de "partido reformista" - imagem que sempre passou ao eleitorado -, a sua função acabou de vez. Não passa do Partido Regenerador mal recauchutado. Desapareça!

Pedro BH disse...

O caro comentador é um pouco radical não?

O Partido Social Democrata apesar da crise que atravessa ainda é o partido português mais reformista e moderno.
Aliás, de todos eles é o que sempre desenvolveu políticas mais vanguardistas e o que mais foge à classificação ideológica do séc XIX ao contrário de todos os outros.
O desaparecimento do PSD seria um revés no sistema politico e na democracia portuguesa.
O que eu defendo não é o desaparecimeto de nenhum partido. É a capacidade de cada um dos intervenientes políticos se reformarem e a possibilidade de novos partidos e formações políticas se afirmarem.

Anónimo disse...

O que no fundo proponho e ponho à reflexão é a ideia da direita portuguesa vir ter uma formação política forte (o que implica uma revisão total, ou se quiserem uma fusão muito bem ponderada e negociada entre PPD/PSD e CDS/PP principalmente). Se tal for possível com os actuais protagonistas tanto melhor, mas parece-me algo que estará muito perto da impossibilidade. Deverá ser algo que nascerá de alguns actuais protagonistas (com vontade para isso e que vêm sentido numa proposta política com estas características) que farão as respectivas pontes com a história política de cada um dos partidos mas sobretudo com novos rostos e personalidades.

O panorama político inglês pode não provocar a queda do regime actual... por enquanto. Mas tendo em conta que os principais protagonistas são um partido trabalhista que não é de esquerda e um partido conservador que tem dificuldade em passar uma mensagem de direita não sei não... Para mim o Reino Unido não é excepção à degradação político-partidária universal. As características neblinas londrinas chegam à política. Mas concordo que o caso específico português é deveras peculiar e em meu entender fruto de um processo de democratização conturbado (democracia essa que está bastante mais consolidada no Reino Unido como é sabido, mas que à semelhança de tantas outras coisas também não será eterna...)

Pedro BH disse...

A fusão do CDS/PP com o PSD a acontecer na actualidade e com os actuais protagonistas só poderia resultar numa divisão do próprio PSd, que verdade seja dita, já esteve mais longe de acontecer.

Como se prevê a breve trecho que o CDS/PP desapareça do panorama político parlamentar vejo como legítima a aspiração de alguns popuplares de tentarem salvaguardar a sua posição numa tábua de salvação social democrata, ou na sua ala direita.

A divisão do PSD em dois partidos era o melhor que podia acontecer ao CDS na verdade.

André SD disse...

Caro Pedro

O que mencionei foi uma eventual fusão entre PPD/PSD e CDS/PP (bem negociada e ponderada) e não uma fusão do CDS/PP com o PPD/PSD. São coisas diferentes.
O capital político e a existência real e parlamentar do CDS/PP não está em extinção (espere pelos resultados do projecto de reorganização dos ficheiros de militantes do partido em questão....)e será muito útil nessa futura reorganização da direita portuguesa. Agora aqueles que são partidários da social democracia (felizmente não são a totalidade dos militantes do PPD/PSD) é que não estarão muito bem enquadrados na direita portuguesa não acha?

joao marques de almeida disse...

Naturalmente que não há para sempre. No entanto, a actual “crise” do PSD (ou melhor, do sistema, pois o PS não lhe escapará) não se radica num cansaço ou apodrecimento por dentro. O seu eminente desmoneramento tem s sua origem em causas mais profundas e irreversíveis, o colapso da “ideologia” e da prática do neoliberalismo que os fundamentava.
Quanto ao partido comunista, na verdade, as premissas que estiveram na sua (suas) origens continuam perfeitamente válidas, ou sejas, as contradições entre Capital/trabalho e as deste par com o modo da distribuição da riqueza produzida. Etc.
Se analisar-mos as causas da impulsão dos países comunistas, como na URSS, Albânia, e as transformações ocorridas noutros, como na China e Correia do Norte, vê-se que os problemas não residiram no modo de organizar os meios de produção nem nos da distribuição, mas sim em causas política, ou se ter transformado uma ideologia política numa religião intolerante de Estado.
Cuba, em condições particularmente difíceis, cercada pelos EUA que tudo fazia, incluindo actos terroristas que custou a vida a muitos milhares de cubanos, e que por isso se justificava uma apertada vigilância e acentuadas restrições a liberdades cívicas, nunca foi, apesar disso, tão longe.
A questão que o (os) partidos comunistas terão (ou deveriam) resolver, é o da compatibilização de um modelo social de produção com as liberdade cívicas.
Joso